Tag: EUA

  • Lista de Músicas sobre o Harlem

    Lista de Músicas sobre o Harlem

    Hoje, amanheci com falta de inspiração. Acontece as vezes, mas acontece! Então, fiquei pensado em alguma coisa para escutar e recuperar a vontade de escrever e me dei conta de que depois de ter encontrado muitas músicas sobre Nova York postei poucas sobre o bairro que eu moro:  Harlem. Aqui vai uma lista de músicas sobre o Harlem

    OBS: Harlem Shake não é do Harlem!!!

    Ok! Depois eu coloco outras….

  • Músicas Sobre Nova York. É Possível Traduzi-la?

    Músicas Sobre Nova York. É Possível Traduzi-la?

    Por Dr. Erick Reis Godliauskas Zen

    Twitter: @erickrgzen

    Músicas Sobre Nova York. É Possível Traduzi-la?…Depois de um ano, quase, vivendo, morrendo, me apaixonando e odiando a organização, a loucura e caos. O concreto. O ferro! A limpeza e o lixo na rua. Os esquilos e os ratos. O rap, blues, punk, a Broadway e a vanguarda… Eu fiz uma lista de músicas sobre Nova York.

    Nova York se funde em muitas em seu ar liberal de gente que não para. Mesmo quando descansa o sujeito de Nova York inventa o que fazer. Tem que ler no parque no domingo. Jogar alguma coisa. Correr! Cuidar da saúde, ganhar dinheiro, parecer rico…

    Os protestos e as greves. A vida importa e quase não importa. O racismo, a violência, as drogas… O sonho Americano na Wall Street. A estátua da Liberdade que nos lembra da beleza da sua sociedade civil. E o Harlem. O Harlem é outra cidade… O Brooklyn já foi outra cidade! Já foi Nova York e agora parece Miami…

    Se palavras me faltam resolvi fazer uma lista de músicas. Tão caótica quanto a própria cidade! Tente gostar de alguma delas.

    Obs: E depois que eu escrevi, encontrei uma enorme lista com, supostamente, todas as músicas que citam Nova York. Confira AQUI

  • Porto Rico em Crise: soluções?

    Porto Rico em Crise: soluções?

    • Crise em Porto Rico
    • Eleição Americana, 2016
    • A Proposta do Senador Sanders

    A crise em Porto Rico é um anúncio da crise americana? É uma pergunta apenas provocativa! Mas que chama a atenção para a precária situação institucional e financeira deste que é um “Estado livre associado” aos Estados Unidos da América (EUA). Com uma dívida de aproximadamente 73 bilhões de dólares, a pequena ilha caribenha não parece ter forças para arcar com sua dívida, sem causar um caos social.

    História de Porto Rico 

    A situação de Porto Rico é bastante intrigante, pois a ilha é parte dos Estados Unidos como um “estado livre associado”. Ou seja, juridicamente é parte dos Estados Unidos, mas não tem a mesma autonomia e direitos dos outros Estados que compõem os Estados Unidos da América.

    Porto Rico era parte do Império Espanhol na América até o fim do século XIX. Com a intervenção dos Estados Unidos na Guerra de independência de Cuba, deu-se início a Guerra Hispano-Americana que terminou com o tratado de Paris de 1898. Nesse tratado, a Espanha repassou por período indeterminado a autoridade colonial sobre Porto Rico.

    Em 1917, os Estados Unidos estenderam o direito de cidadania aos nascidos em Porto Rico. No entanto, alguns direitos lhes foram negados, como o de votar para a Presidência da República (embora possam votar nas primárias atualmente).

    É bem verdade que sempre houve grupos pró-independência em Porto Rico. Alguns com ações violentas, mas nas duas vezes em que a questão da autonomia foi levada a referendum a população optou por outro caminho. No referendum de 1998, foi decidido pela não independência e pela manutenção de Estado Associado.

    Em dezembro de 2012, um referendo na Ilha expressou, por 65%, a vontade de Porto Rico em se tornar um estado dos EUA. No entanto, para alcançar esse status é necessária a aprovação do Congresso Americano, o que ainda não aconteceu. Se é que vai acontecer! Assim, Porto Rico tem o direito de eleger o seu próprio governador e sua língua oficial é tanto o inglês quanto o espanhol. O espanhol é mais utilizado.

     A Crise em Porto Rico

    Atualmente, Porto Rico detém uma dívida de aproximadamente 73 bilhões de dólares. Ela foi adquirida através de empréstimos com diversos fundos e o atual governador Alejandro Garcia Padilha declarou que a dívida é simplesmente “impagável”. A ilha já deixou de realizar pagamentos, o que levou a uma situação de desgoverno.

    A situação chegou ao Congresso Americano que deveria apontar soluções para o problema. Depois de meses de inação, aprovou uma medida intitulada PROMESA (Oversight Management and Economic Stability Act), em um acordo entre os dois partidos Republicanos e Democratas. De acordo com o ato seriam escolhidos pelos líderes do Congresso sete membros fiscais com amplos poderes de negociação. Eles também poderiam realizar cortes no orçamento poderiam suspender leis locais e congelar pagamentos.

    Críticos a essa medida observam que uma comissão com tais poderes seria uma forma de recolonização de Porto Rico, mais do que isso. A comissão atuaria em favor dos credores e não da população local ampliando a crise na Ilha, que já acumula taxa de desemprego de 12%. Uma taxa muito maior do que a média dos outros Estados Americanos. Acrescenta-se a esse fator desestabilizador a enorme emigração, sobretudo entre os mais jovens.

    É preciso lembrar que muitos cidadãos de Porto Rico tem suas poupanças e aposentadorias investidas em títulos do governo, ou seja, a depender da negociação a ser realizada, o resultado pode ser a ampliação da pobreza principalmente na população mais vulnerável.

    Solução proposta por Sanders?

    Todas essas questões surgem, pois Porto Rico, como Estado Associado, não tem os mesmos direitos dos demais Estados. Por exemplo, o de utilizar a lei de falências que já foram utilizadas por cidades como Detroit. Neste sentido, desprotegido de uma lei que possa representar segurança e dar alguma margem de negociação para Porto Rico, seus credores têm poucos motivos para acelerar um processo de negociação ou reestruturar a dívida, já que não estão sujeitos às leis Americanas.

    Em um último esforço para aliviar a situação, o Senador e pré-candidato à Presidência Bernie Sanders propôs que o “Banco Central Americano”, o FED, use a mesma “imaginação” e engenharia financeira utilizada para resgatar empresas em dificuldades durante a crise de 2008. Na ocasião, o FED abriu os seus cofres e ofereceu bilhões em empréstimos e subsídios para salvá-las da falência.

    Por agora, ao que tudo indica, a voz de Sanders parece ecoar solitária. Os Olhos do público americano (ao menos aqueles que se preocupam com a coisa pública) está voltado para as próximas eleições.

    O debate 

    A discussão sobre Porto Rico tem ocupado um lugar bastante marginal na imprensa dos Estados Unidos. Ele também não foi tratado com a devida atenção por nenhum dos pré-candidatos (a exceção de Sanders dentro do Congresso). Parece que assim, a situação de Porto Rico, terá que ser tratada pelo próximo Presidente já que a dívida, que tem uma significativa parcela a vencer no dia Primeiro de Julho e, ao que parece, não será paga.

    Qual será o futuro de Porto Rico? E como os EUA vão lidar com os seus débitos? Perguntas que o próximo Presidente dos EUA terá que responder.

  • Sobre Sanders e a eleição americana 

    Sobre Sanders e a eleição americana 

    Caros amigos,

    Tive a oportunidade de publicar uma síntese das minhas reflexões sobre Bernie Sanders e a eleição americana no blog do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais IPPRI/UNESP

    O artigo sobre Bernie Sanders e a eleição americana tem o título: Um Socialista à Americana? Conheça Sanders, o democrata. Segue o link: http://neai-unesp.org/um-socialista-a-americana-conheca-o-democrata-bernie-sanders-por-erick-zen

  • Bernie Sanders e a Eleição Americana

    • Candidatura de Bernie Sanders
    • Ideias democratas socialistas
    • Socialismo nos Estados Unidos

    O Fenômeno Democrata Bernie Sanders

    Na imprensa brasileira, e mesmo nas publicações especializadas, fica evidente a dificuldade dos analistas em entenderem o fenômeno Democrata Bernie Sanders. Para muitos, um candidato à presidência dos Estados Unidos que se apresente como Democrata Socialista, é exótico! Para outros, ele não seria um “verdadeiro socialista” e, finalmente, a direita, já utilizou até mesmo a palavra populista para defini-lo.

    Neste pequeno texto vou esboçar (sim esboçar!) a resposta para duas perguntas: 1) Por que os analistas brasileiros têm dificuldade em lidar com os fenômenos da política interna dos Estados Unidos ? 2) O que o fenômeno Sanders nos diz sobre a sociedade americana? Esse texto completa o primeiro publicado AQUI

    O Brasil é o seu Eurocentrismo

    Uma das coisas mais impressionantes sobre as Ciências Humanas no Brasil é o seu eurocentrismo! Eurocentrismo tanto na elevada carga horária dos cursos de graduação como na visão europeia de mundo que coloniza a nossa percepção. Apenas aponte um único curso de História de Ciências Políticas, Relações Internacionais e Jornalismo que se dedique a História e a sociedade americana e eu mudo esse parágrafo. No geral, o que vi (e mais de uma vez) foi a História da América Latina e História dos EUA perderem espaço nas grades dos cursos substituídas, na maior parte das vezes, por um blá-blá-blá pseudo teórico ou por regionalismo provincianismo pseudo culturais.

    Com isso, o nosso conhecimento, e a produção do conhecimento, sobre Estados Unidos é muito limitado. No que se refere as questões temáticas, em geral, os estudos se limitam a política externa americana e sua influência no Brasil e muito pouco sobre a sociedade americana (a excessão são as comparações entre escravismo no Brasil e nos EUA).

    Nossos analistas.

    Como resultado, não dispomos de analistas que tenham instrumentos intelectuais adequados para interpretar a sociedade e a política americana e, quando a fazem, utilizam instrumentos e paradigmas europeus para a análise. Isso é realmente incrível! Afinal, qual foi o país mais influente no Brasil em termos culturais e políticos no último século? E justamente este é o que você, caro colega de humanas, não estuda!

    Diante deste quadro, o que resta são muitos chutes e desentendimentos. O fenômeno Sanders poderia servir como estudo de caso, nesse sentido. O primeiro erro é tentar analisar o que Sanders propõe como “socialismo” através da história da Europa. Assim, tentamos entender Sanders pela lente do Partido Social Democrata Alemão ou pelo Partido Socialista Francês, ambos utilizados como paradigma de social democracia. Ocorre que, em grande medida, o “socialismo”, tem um desenvolvimento histórico particular nos Estados Unidos.

    O Desenvolvimento do Socialismo nos EUA

    Se é verdade que o Partido Socialista e o Comunista Americano seguiram por longo tempo os caminhos da Segunda e da Terceira Internacional, no que se refere ao campo das ideias, muitas perspectivas socialistas e anarquistas nos EUA se combinaram com um liberalismo radical, em particular na virada do século XIX para o XX. Portanto, se não for considerado o desenvolvimento particular do socialismo nos EUA, a tendência que se tem é de considerar Sanders como um exótico, ou como um falso socialista. Na verdade, a dificuldade aqui são dos analistas e não do candidato.

    Um dos lugares mais profícuos do desenvolvimento socialista e anarquista nos EUA foi Nova York, em especial em dois bairros no Harlem e no Brooklyn. Bairros estes que são tradicionalmente de operários negros, mas também de imigrantes do leste Europeu, no início do século, e de imigrantes latinos, a partir da segunda metade do século XX.

    No Brooklyn, como filho de judeus imigrados da Polônia, que Sanders nasceu e foi criado, em uma família com ideias de esquerda. Em muito, esses imigrantes operários, como ele, se desenvolveram economicamente e chegaram ao sonho da classe média americana.

    O socialismo de Sanders

    Portanto, o socialismo que Sanders viveu e viu se desenvolver como princípio e ideal é histórico e não oportunista. O socialismo americano, no decorrer do século XX (e aqui precisaria de páginas e páginas para explicar como), toma bandeiras como da igualdade e equidade o que muito significou salário justo, direitos trabalhistas, direitos civis (sobretudo para inclusão do negro, indígena e das mulheres).

    Ao mesmo tempo, também apresentou uma crítica aguda ao domínio do Estado por uma plutocracia financeira, ao segredo de Estado, as guerras não justificadas, a crítica ao crescente poder do complexo militar e industrial sobre democracia. Não foi atoa que a primeira aparição de Sanders como ativista político se deu na luta por direitos civis e contra a Guerra do Vietnam.

    A essas bandeiras, a esquerda socialista americana acrescentou uma defesa dos direitos humanos e aos direitos constitucionais e principalmente, (principalmente!) nos direitos dos trabalhadores! E a defesa do poder local como fundamental para a democracia.

    Bernie Sanders Carregou Essas Bandeiras

    Desde que se iniciou na atividade política, Sanders carregou todas essas bandeiras, mesmo quando isso significou enormes contradições. Por exemplo, sua defesa radical da constituição americana, o que inclui a Segunda Emenda, fez com que ele nunca defendesse a restrição ao uso das armas de fogo! Quando foi eleito como Governador do Estado de Vermont recebeu doações da NRA (Associação Nacional do Rifle), principal lobista dos fabricantes de arma.

    Por outro lado, sua coerência fez com que ele fosse um dos poucos Senadores a votar contra a intervenção militar no Iraque e ser um forte crítico das guerras recentes que os EUA se envolveu. Incluindo ai a guerra ao terror e ao excessivo poder das agências de informação para espiar os cidadãos americanos.

    Isso não significa que não tenha posições duras com relação a política externa, pelo contrário. Sanders é um grande defensor, por exemplo, do Estado de Israel. Em um comício de sua campanha um militante pró-palestina que o criticava foi retirado a força do evento.

    Bernie Sanders e suas ideias

    Se as ideias de Sanders não são novas, o que o levou a crescer politicamente a ponto dos democratas preferirem a ele e não a Clinton? A reposta está na defesa dos direitos trabalhistas! Esse é o ponto central!

    Desde a crise de 2008 os EUA passaram por uma enorme onda de desemprego que vai até 2010 (2011). Atualmente, a maioria dos americanos já recuperou o emprego (o desemprego está por volta de 5%). No entanto, nesse dado tem uma “pegadinha”.

    Se o emprego aumentou o salário diminuiu! Ou seja, os americanos que já estiveram próximos a classe média tem dificuldade em pagar as suas contas. Quem recebe o salário mínimo ($7 dólares por hora) não consegue pagar por aluguel ou hipoteca, ter um plano de saúde. Vale lembrar que nos EUA não há saúde pública universal e é preciso comprar um plano privado ou agora Estatal). Pagar educação (College) para os filhos também é proibitivo.

    É para essa população e para a classe média, que perdeu o seu poder de consumo, que as propostas de Sanders soam como música. Propostas tais como: elevação do pagamento mínimo, saúde universal, acesso a educação entre outras.

    O Papel dos jovens

    Ainda é preciso acrescentar o papel dos jovens que aderiram a campanha. Atualmente, as possibilidades de um recém formado em uma faculdade entrar ou de se manter na classe média, na atual situação americana, é bastante limitada. Com as enormes dívidas que os jovens acumulam para estudar, somadas as dificuldade para se conseguir um emprego, com benefícios ou contrato longo, a ascensão social é limitada.

    No mesmo sentido, as críticas ao poder dos financistas e ao complexo militar na democracia americana, e a proposta regulamentar essa participação, revelam que a maior parte dos americanos entendem que a sua democracia corre risco, quando o poder financeiro é maior do que participação popular.

    O candidato Bernie Sanders, portanto, não é um exótico, oportunista, populista. Pelo contrário, ele faz parte das lutas políticas e das crises recentes pelas quais os Estados Unidos passaram nas últimas décadas. A luta é histórica e ganhou força diante de uma conjuntura em parte estrutural e em parte específicas. Se tudo isso será suficiente para conseguir a vitória sobre Hillary Clinton e sobre o candidato Republicano ainda é cedo para saber. O que certo é que tentar entender Sanders e suas ideias a partir de uma referência europeia ou latino-americano não vai facilitar o nosso entendimento do processo eleitoral americano.

  • Morar no Harlem: Hotel Theresa

    Morar no Harlem: Hotel Theresa

    Por: Dr. Erick Reis Godliauskas Zen

    Twitter: @erickrgzen

    Encontrar com o Hotel Theresa foi uma das minhas primeiras surpresas, quando cheguei a Nova York e fui morar no Harlem. Entrar no Harlem é encontrar uma parte dos Estados Unidos que fica, muitas vezes, oculta aos olhos dos turistas. Na realidade, é comum vermos o brasileiro de classe média confundir a Disneyland com a sociedade americana. Longe dos bichinhos de Orlando, da coisa brega de Miami e dos espetáculos para o público do terceiro mundo da Broadway, a sociedade americana é muito mais complexa, plural, repleta de contradições e conflitos.

    São essas contradições e conflitos que encontramos em um bairro historicamente composto por maioria negra e latina (e de negros latinos) como é o Harlem. Em cada uma das suas esquinas e das suas construções, esse bairro de trabalhadores guarda a história de luta e sofrimento dos que não foram plenamente favorecidos pelo sonho americano.

    Assim, decidi escrever alguns pequenos textos sobre o lugar onde agora resido e suas localidades históricas. Não escolhi escrever por tema ou importância e ainda não sou capaz (e não sei se serei) de escrever uma história geral do bairro. De uma forma livre, a partir das minhas caminhadas, encontros e desencontros, vou buscar contar algumas de suas histórias.

    Hotel Thereza

    Descendo a Rua 125 olho para o horizonte e vejo um enorme prédio branco e antigo. Lá no alto o letreiro indica Hotel Theresa. O hotel ficou conhecido por ser o primeiro a acabar com a segregação racial e pelos encontros inusitados que ali aconteceram.

    Fidel Castro no Harlem.

    Quando Fidel Castro veio a Nova York para discursar na ONU, após a Revolução Cubana, teve muita dificuldade em ser aceito nos hotéis da cidade. Por má vontade dos proprietários de hotéis solidários aos seus pares cubanos que perderam seu negócio devido à Revolução, pelas pressões do governo e por todo o movimento anti-comunista que se lançava contra Cuba, nenhum hotel se dispôs a aceitar a delegação cubana.

    Eis que um hotel, confortável, mas menos luxuoso que seus pares no centro financeiro de Manhattan, resolveu abrir as suas portas. O Hotel Theresa era um dos poucos hotéis em Nova York cujo proprietário era negro. Seu nome era Love B. Woods e em 1940 colocou fim à segregação racial no estabelecimento. Sua justificativa para aceitar Fidel Castro e os demais membros da delegação cubana foi extraordinário, disse ele: “como negro americano eu sei o que é ser rejeitado”.

    Foi assim que Fidel Castro chegou ao Harlem e com ele uma tropa de curiosos, políticos e do FBI que monitorou cada encontro, cada conversa que teve o líder cubano. E ali na Rua 125 foram realizados encontros políticos de personagens que marcaram o século XX.

    Um dos visitantes de Fidel Castro no Hotel Theresa foi Malcolm X, o lendário líder do movimento negro islâmico que pouco depois seria assassinado. O conteúdo do diálogo foi inteiramente anotado pelos espiões do FBI que acompanharam de muito perto a conversa.

    O mesmo caminho de encontro com Fidel Castro fez o então jovem candidato à presidência dos Estados Unidos John Kennedy que esteve pela primeira vez frente a frente com o presidente cubano. Depois de eleito, o mesmo presidente tentou derrubar Fidel Castro no fatídico episódio da Bahia dos Porcos. Assim como Malcolm X, o presidente americano também acabou por ser assassinado.

    As visitas não pararam por ai, o líder soviético Nikita Khrushchev entrou no hotel para conhecer o líder cubano. Já teria ele se convencido a aceitar o comunismo naquele momento nunca saberemos, mas o que é certo é que a presença de um revolucionário vindo de um país subdesenvolvido atraiu outras lideranças que fizeram uso dos apartamentos desenhados pela empresa George & Edward Blum em sua decoração de terracota construída entre os anos de 1912 e 1913. Assim, naqueles poucos dias passaram por ali o presidente do Egito Gamal Abdel Nasser, o Primeiro Ministro da Índia Jawaharlal Nehru e o líder do Congo Belga Patrice Lumumba. Além dos líderes políticos, escritores como e poetas como Langston Hughes e Allen Ginsburg também foram conhecer Fidel Castro. Se aqueles dias foram quentes para o hotel, esteve longe de ser o único…

    Hotel Theresa: racismo e resistência

    Aqui entra o outro lado da história americana e o seu racismo. Muitos hotéis de luxo de Manhattan se recusavam a receber hóspedes negros, mesmo aqueles que já tinham obtido fama. Desta forma, o Hotel Theresa acabou por se tornar o local de hospedagem dos músicos que iriam se apresentar no Teatro Apollo, que dista apenas uma quadra do hotel e também dos principais atletas, em particular dos lutadores de boxe. Entre os hóspedes mais ilustres estiveram os músicos Luis Armstrong, Ray Charles, Duke Ellington, Jimi Hendrix, Lena Horne, Little Richard, Dina Washington e aquele que também foi gerente do bar do hotel Andy Kirk.

    Entre os atletas, os boxeadores Muhammad Ali, Sugar Ray Robinson, Joe Louis entre outros. O hotel também abrigou organizações do movimento negro como Organization of Afro-American Unity criado por Malcolm X depois que ele deixou a Nation of Islam (Nação Islâmica). O hotel também chegou a abrigar uma livraria que difundia as obras do movimento negro.

    O hotel, e o bairro em geral, foram locais de duras lutas políticas que deixaram as suas marcas até os dias de hoje. Atualmente não há nenhum registro no prédio que lembre os seus tempos de hotel, apenas os letreiros e a fachada que tem de ser preservada, pois o local é considerado um marco histórico da cidade de Nova York. Assim, um visitante que não conheça a história do local pode passar por ele sem percebê-lo ou sem se dar conta da sua importância histórica.

    Hotel Theresa. Foto Erick Zen
    Hotel Theresa. Foto Erick Zen

    Hotel Theresa. Foto Erick Zen
    Hotel Theresa. Foto Erick Zen

  • Bernie Sanders Um “Socialista” na Casa Branca?

    Bernie Sanders Um “Socialista” na Casa Branca?

    • A pré-candidatura de Bernie Sanders
    • Uma análise da trajetória
    • Sobre as suas ideias

    A mídia tem destacado recentemente a candidatura do midiático, machista, anti-imigrantes, anti-latinos, anti-China e anti-etc. Donald Trump. Com seu jeito espalhafatoso, cabelo engraçado e sem nenhuma educação – em recente debate chegou a perguntar a uma mulher que o questionava se ela estava “no seu período” (TPM) – o candidato tem chamado a atenção de todo o mundo, mais pelas suas bobagens do que pelas suas propostas. Contudo, o fato mais relevante dessas eleições primárias – período de definições dos candidatos nos dois partidos – está do lado Democrata, com o crescimento de Bernie Sanders.

    Em sua página, Bernie Sanders se define como um “democrata socialista”. Seu programa de governo é uma ruptura tanto com as plataformas do atual presidente Obama, como com as tradicionais plataformas apresentados pelos candidatos Democratas. Sua trajetória política não deixa dúvidas sobre o seu desejo de mudar os Estados Unidos. Ao longo de muitos anos como congressista, a maior parte das vezes eleito de forma independente, sem vínculos com Democratas ou Republicamos, ele defendeu as posições mais progressistas. Entre elas: sistema de saúde universal, direito LGBT, igualdade de pagamento para homens e mulheres, igualdade racial, etc.

    Bernie Sanders uma trajetória pelos Direitos Civis

    No Congresso foi um dos poucos a votar contra a Guerra no Iraque durante o governo Bush. Criticou ainda ferrenhamente o corte de impostos para os ricos feitas por este presidente. Posicionou-se contra o USA Patriotic Act, adotado após o atentado terrorista de 11 de setembro, que deu enormes poderes de espionagem e retirou direitos civis. Mais recentemente se tornou um dos críticos dos programas de espionagem defendendo, como sempre, os direitos civis.

    Sua paixão pelos direitos civis tem uma longa trajetória e um acúmulo de experiência que deixam claro não se tratar de um oportunista. Ele é um militante histórico em prol das causas em que acredita. Iniciou sua carreira na juventude da Liga Popular Socialista, participou ativamente da luta pelos Direitos Civis na década de 1960, do histórico Congresso pela Igualdade Racial, bem como diretamente se envolveu no movimento estudantil pacifista contra a Guerra do Vietnã. Em 1963, ele participou da Marcha de Washington por Emprego e Paz.

    No seu Estado, Vermont, foi eleito Mayor por três vezes prefeito de Burlington, a principal cidade. Serviu como Congressista deste Estado por dezesseis anos e foi eleito Senador em 2006 e reeleito em 2012 com 71% dos votos.

    Desta forma, Sanders reúne duas características muito importantes: uma ampla trajetória e larga experiência na administração pública, além de uma incondicional luta pelos direitos das minorias. Sua visão de economia também é bastante diferente da dos demais candidatos. Ele não defende uma forma de liberalismo, mas a de ver nos países nórdicos um possível horizonte. Assim, propõe que os mais ricos paguem mais impostos e que o Estado seja provedor de melhores e universais serviços públicos, como saúde, educação, etc.

    Bernie Sanders é um candidato de esquerda?

    Não há dúvida de que Sanders é o candidato mais à esquerda que os Estados Unidos tiveram na sua história recente. Ao menos com chances reais de vitória. No entanto, o seu radicalismo político está longe da esquerda radical europeia ou latino-americana. Sua visão de transformação está mais próxima a uma humanização do sistema econômico, através de garantias de direitos universais através do Estado

    Se Sanders vai superar Clinton ainda é cedo para saber. Nas últimas pesquisas ele já aparece muito bem posicionado. Mesmo diante dos possíveis candidatos Republicanos, o que tem aumentado significativamente as suas chances de vitória nas primárias.

    Analisando o conjunto, o comportamento do eleitorado americano, ao que parece, está buscando, por um lado ou pelo outro, um candidato fora do status quo da política atual. Assim, o esperado e quase dado como certo, embate entre em os clãs Clinton e Bush está ficando para trás.

    E nós?

    O que é surpreendente, ou nem tanto, é que a mídia brasileira esteja dando tamanho espaço para Donald Trump. Ela nem mesmo olhe para as outras possibilidades. Ela parece preferir alguém que seja machista, anti-imigrantes, liberal e veja todo o resto do mundo como uma ameaça. Talvez a mídia brasileira veja no candidato midiático seu próprio reflexo e desejo. Por sorte a sociedade americana é bem mais complexa do que os jogos televisivos de humilhação coletiva.

  • O Clima no Subterrâneo

    O Clima no Subterrâneo

     
     Por Dr. Erick Reis Godliauskas Zen
    Twitter: @erickrgzen 
     
    • O radicalismo político na década de 1970
    • A formação do grupo armado
    • A clandestinidade
    • A mudança no clima

    O Clima do Subterrâneo… Normalmente quando pensamos nos movimentos sociais nos Estados Unidos nas décadas de 1960 e 1970 sempre tomamos como referência os movimentos pacifistas, como o hippie, o movimento negro liderado por Martin Luther King ou os demais movimentos de contra cultura. Assim, pouco refletimos sobre os movimentos que passaram à luta armada, como os Panteras Negras ou aquele que é o menos conhecido: o Weather Underground. Um grupo reduzido, mas que produziu diversos atentados a bomba ao longo da década de 1970.

     

    Por ser o menos conhecido dos grupos é que o documentário de Weather Underground de Sam Green e Bill Sigel se tornou uma referência para pensarmos o que significou da passagem dos movimentos pacifistas de massa para a luta armada no habito da esquerda naquelas décadas. No caso norte- americano, abordar esse tema se faz ainda mais complicado devido aos traumas causados pelos atentados de 11 de Setembro e também, pelo mortífero atentado realizado por um extremista de direita em Oklahoma.

    O documentário combina documentos históricos, filmes, fotos, leitura de trechos de memórias com depoimentos de ex-integrantes do grupo, entre eles Mark Rudd, Brian Flanagan, David Gilbert, Bill Ayeres, Brian Flanagan. Os depoimentos funcionam tanto como fio condutor da história como inserem momentos de reflexão na busca por motivos, explicações e justificativas para as opções que tomaram naquele período. O documentário também apresenta, de forma competente, o contexto histórico em que o movimento se inseriu e a recuperação do “clima” da época é a melhor contribuição do documentário (e ao meu ver a melhor contribuição que qualquer documentário histórico pode oferecer).

    1. E qual contexto era esse?

    No final da década de 1960, os movimentos sociais pacifistas que lutavam contra a guerra do Vietnã e pelo movimento negro chegaram a um impasse! Por maior que fossem as suas manifestações de massa, as marchas e as outras formas de protestos a direita continuava a vencer as eleições e a ofensiva militar no Vietnã era cada vez maior e mais violenta.

    Esse impasse marcou o congresso organizado pelos Estudantes por uma Sociedade Democrática em 1969. A organização foi fundada entre os estudantes universitários e adotava táticas pacifistas de manifestação e por isso crescera rapidamente durante a luta contra a guerra do Vietnam. No congresso, a liderança da organização passou para as mãos de um pequeno grupo denominado Weathermen (O homem do Tempo) que pregava ações violentas e de enfrentamento contra o Estado. O nome Weathermen foi inspirado na letra de uma música de Bob Dylan: “Não é necessário um meteorologista para saber para qual direção sopra o vento”. E o vento, em 1969, soprava para a revolução em diversas partes do mundo que assistia às ações dos Panteras Negras, do Partido Comunista no Japão, em Angola (luta contra os portugueses). Revolução cultural chinesa, França, México, Vietnã, Congo, Alemanha…

    Bob Dylan, Subterranean Homesick Blues
     
    Maggie comes fleet foot
    Face full of black soot
    Talkin’ that the heat put
    Plants in the bed but
    The phone’s tapped anyway
    Maggie says that many say
    They must bust in early May
    Orders from the DA
    Look out kid
    Don’t matter what you did
    Walk on your tip toes
    Don’t try, ‘No Doz’
    Better stay away from those
    That carry around a fire hose
    Keep a clean nose
    Watch the plain clothes
    You don’t need a weather man
    To know which way the wind blows.
     

    2. A Radicalização Política

    Para completar o quadro, o ano de 1969 marcou o fim da esperança no movimento “paz e amor” e dois eventos se tornaram símbolo do fim de festa hippie: os assassinatos liderados por Charles Manson e sua seita “Família” e o assassinato cometido pela gangue de motociclistas, Hell Angels durante um show dos Rolling Stones no Altamont Speedway, na Califórnia.

    Sob a liderança dos Weathermen, a Sociedade Democrática chamou a manifestações com um discurso de enfrentamento, anunciando o início do chamado “Dias de Fúria”… Foi um fracasso! A manifestação em Chicago reuniu entre 150 e 200 pessoas e o conflito com a polícia se generalizou pelas ruas da cidade.

     

    Para além das manifestações, os estudantes deram início a um movimento de “sair do campus” e formar casas coletivas nos bairros operários. A ideia era abandonar a vida burguesa dos campus universitários e se juntar à luta dos trabalhadores. Era um movimento subversivo, pois a liberação do mundo burguês significava o abandono da sua moral e pela busca da liberdade sexual, abandonando a monogamia, do culto à heterossexualidade, do machismo, etc.

    O movimento buscava, assim, construir uma base operária e libertária, mas não teve êxisto, pois mesmo os Panteras Negras rejeitavam a proximidade com o movimento. Os Panteras os viam como brancos, pequeno burgueses, que utilizavam métodos infantis de enfrentamento. Mesmo sem o apoio o Weathermen buscou sempre a proximidade com o movimento negro e reagiu à extrema violência do Estado americano posta contra essa organização.

     

    O então presidente Nixon estava decidido a destruir os Panteras Negras e essa determinação levou a polícia a assassinar uma importante liderança revolucionária negra: Fred Hampton, um jovem que ficou conhecido pelos seus discursos eloquentes e organização de manifestações. Sob o pretexto de buscar armas em sua casa, a polícia o fuzilou, enquanto ele dormia. A resposta dos Panteras Negras foi abrir a casa de Hampton a visitação pública, mostrando a quem quisesse a quantidade de furos de bala na casa e o colchão repleto de sangue onde ele dormia no momento de seu assassinato.

    3. A Clandestinidade

     

    Diante da violência de Estado, o Weathermen decidiu responder com violência e adotou seu famoso lema: “Trazer a Guerra para Casa”. A ideia principal era promover uma série de eventos catastróficos que pudessem “despertar” o público americano para os horrores da guerra. O primeiro projeto fracassou, pois no momento em que um pequeno grupo montava uma bomba em uma casa na cidade de Nova York ela acidentalmente explodiu e matou os três integrantes.

     

    Com a explosão e a pressão do Estado o Weathermen teve que passar para a clandestinidade, formou-se assim o Weather Underground (O Clima no Subterrâneo). A explosão também levou a uma reflexão sobre a tática a ser utilizada, por um lado havia um entendimento de que “não havia inocentes” nos EUA, por outro não se desejavam ataques que pudessem matar civis. Assim, os alvos do grupo tinham objetivos simbólicos e não pessoas.

    O primeiro atentado, por exemplo, teve como alvo o edifício sede da administração penitenciária em resposta à morte de George Jackson, um importante líder do movimento negro dentro dos presídios, morto em uma suspeita tentativa de fuga. A partir daí uma série de atentados, nenhum deles causando mortes, foram realizados até o ano de 1975, incluindo o Capitólio, a Universidade de Harvard, a sede da polícia de Nova York…

     

    Uma das ações mais espetaculares do grupo foi planejar e executar a fuga de Timothy Leary da penitenciária da Califórnia. Leary era conhecido por pregar o uso do LSD como forma de “abrir as portas da percepção” e suas ideias tiveram ampla influência nos movimentos de contra cultura (inspirou o nome do grupo The Doors). Depois de fugir Leary se dirigiu à Argélia onde se juntou a Eldridge Cleaver, líder dos Panteras Negras e ali lutaram pela libertação do país do domínio francês.

    4. A Mudança no Clima.

     

    No meio da década de 1970, o clima no subterrâneo começava a fechar e o vento da revolução já não soprava com a mesma intensidade. A Guerra do Vietnam chegara ao fim, com a humilhante derrota americana. Os Estados Unidos entraram em uma forte recessão e a sociedade em um clima de desesperança, com as sucessivas vitórias de presidentes conservadores. Mesmo na esquerda, o clima não era favorável. Houve um processo de fragmentação, no qual ganhou força o movimento feminista, ecologista, etc. Para piorar a situação, o FBI havia se infiltrado no grupo com uma unidade especial, provocando conflitos, desinformação e desconfianças, colocando todo o grupo em crise.

     

    Como acontece com os grupos clandestinos, quando chegam ao ponto da irrelevância, o Weather Underground começou a se devorar e se autodestruir. Perdera o sentido de sua existência e ficou reduzido a poucas pessoas, cerca de 30 na década de 1980. Como resultado, a maior parte do grupo se apresentou à justiça e se entregou. No entanto, a justiça americana não conseguiu condená-los, pois ao longo do processo de investigação a polícia cometeu tantas irregularidades que os processos não puderam ter sequência.

     

    O documentário, muito bem elaborado, e sem se perder em discursos morais, nos coloca, através da análise de um grupo específico, diante das esperanças e tragédias vivenciadas pela esquerda, em escala global, entre o final da década de 1960 e a metade da década de 1970: movimentos de massas exigindo democracia direta, o enfrentamento de um processo repressivo, a radicalização e a luta armada, por um lado, a fragmentação por outro. A derrota de ambas perspectivas pela derrocada do socialismo real e a vitória do neoliberalismo… Até que o vento mudasse novamente de direção.

    • Se você GOSTOU deste artigo inscreva o seu e-mail para receber atualizações
    • Sobre radicalismo político nos anos 1970 (Aqui)
    • Acompanhe a nossa página no Facebook
    • Conheça nosso canal no YouTube.
  • FBI uma História dos seus Inimigos

    FBI uma História dos seus Inimigos

    • Sobre Tim Weiner
    • uma estimulante pesquisa
    • as polêmicas entorno de Edgar Hoover
    • Filme J Hoover de Clint Eastwood
    • Tim Weiner. Enemies. A History of the FBI.  New York, Random House, 2012.

    O livro Inimigos: Uma História do FBI, de Tim Weiner, é uma obra estimulante e instigante, pois busca traçar um amplo histórico do FBI, desde a sua fundação até o ataque  terrorista de 11 de setembro, além de apontar alguns dos problemas atuais da instituição e do sentimento de fracasso que se abateu sobre todos os órgão de inteligência americanos, após o ataque às Torres Gêmeas.

    Unknown

    O jornalista Tim Weiner é um autor reconhecido e premiado. Ele recebeu o Pulitzer (o principal prêmio nos EUA), pelo livro Legacy of Ashes, um livro dedicado a analisar a CIA. Durante anos, ele foi correspondente do jornal New York Times (entre outros) cobrindo a CIA e se tornou um especialista em temas relacionados a inteligência. Os jornalistas americanos, mesmo entre os conservadores, são capazes de realizar habilidosas e competentes pesquisas históricas e, eis aqui, um bom exemplo.

    Os Inimigos do FBI

    Uma  característica importante do trabalho de pesquisa do autor foi a utilização somente de materiais, documentos, “desclassificados” e, portanto de acesso público. Isso permite que o leitor interessado, como eu, busque as fontes sem dificuldades. Claro, que essa forma de trabalhar só é possível quando há uma política de arquivos (que não é perfeita, mas é melhor do que a nossa). Esse procedimento evita, também, as especulações, o uso de fontes ocultas e inventadas, como muitas vezes já vimos por essas terras.

    A narrativa proposta por Weiner é organizada de forma cronológica e o livro é dividido de acordo com a administração, ou seja, o presidente que governava. Esse é um procedimento clássico na história e no jornalismo norte-americano. Essa característica reforça um dos pontos fortes do livro: como cada presidente americano lidou com os órgão de segurança? Assim, somos informados sobre os dilemas de Roosevelt, os usos e abusos de  Nixon, a desconfiança com relação aos democratas, em particular Kennedy, e Clinton que deixou o FBI à míngua em termos de recursos.

    Quem foi Edgar Hoover? 

    Nessa relação entre a instituição e os presidentes a principal figura, e não poderia ser diferente, é John Edgard Hoover, pois foi ele foi o primeiro diretor do FBI e permaneceu no cargo de 22 de março de 1935 até 2 de maio de 1972, quando faleceu.  Portanto, dirigiu o FBI por 48 anos! (vou concentrar este post neste aspecto). Interessante notar que em um país com alternância democrática na presidência, um dos cargos mais importantes dentro da segurança de Estado tenha experimentado tamanha estabilidade.

    John Edgar Hoover, nasceu em Washington D.C em janeiro de 1895 e quando entrou nas forças policiais, enfrentava sobretudo as “ameaças” internas, os anarquistas, que haviam realizado diversos atentados nos EUA, e posteriormente os comunistas. Sem esquecer do combate ao crime organizado, que foi o que levou Hoover a fama. Após a Segunda Guerra Mundial foi Hoover quem preparou o FBI para enfrentar a Guerra Fria e, claro, o crime organizado.

    A análise e caracterização de Hoover realizada por Weiner é muito intrigante. O autor demonstra que o diretor do FBI era capaz de odiar igualmente qualquer coisa que demonstrasse uma ideologia… Que demonstrasse rejeição ou que se diferenciasse do “sonho americano”, dos “valores americanos”. Assim, perseguiu violentamente, e muitas vezes usando recursos ilegais: anarquistas, comunistas, o movimento negro, hippies,  mas também os movimentos racistas como a Ku Klux Klan e os movimentos que pregavam (ainda pregam) a supremacia ariana. Alguns dos seus “inimigos” foram personalidades públicas, como Luther King… e por aí vai!

    Outra característica de Hoover era o seu personalismo. Em muitos casos tratava pessoalmente das operações e mantinha um arquivo próprio de informações. Em muitos documentos as instruções e as comunicações eram realizadas com um E. H., na borda, indicação clara de quem dera a instrução e como deveria ser seguida.

    Hoover homossexual?

    Um ponto polêmico do livro é a análise da relação entre Hoover e seu principal assistente: Clyde Tolson. Na literatura recente sobre Hoover encontramos de forma explicita e / ou  sugerida a homossexualidade de Hoover e os dois são frequentemente descritos como amantes. Esse aspecto foi explorado em algumas biografias e até no cinema. Tim Weiner descarta essa ideia, para o autor, Hoover não manteve relações sexuais com Tolson ou com “qualquer outro ser vivo”. Assim, para ele, Hoover era “assexuado” (palavra minha e não do autor).

    Parece um argumento estranho, para dizer o mínimo, porém a visão de Weiner sobre o contexto da sociedade americana é mais interessante do que qualquer argumento sobre esse aspecto. Afinal, cabe questionar: Qual é a relevância desse fato (se foi um fato)?  Qual a relevância em se saber se o diretor do FBI era ou não homossexual? Não seria esta uma questão secundária? Uma questão privada para além das ações públicas de Hoover?

    FBI e a perseguição aos homossexuais

    Seria! Ocorre que entre as páginas mais obscuras da história do FBI está a de uma ampla perseguição aos considerados “desviados” sexualmente. Neste “desvio”, os principais “inimigos” foram os homossexuais e as prostitutas. Assim, o debate (se é que é um debate) seria até que ponto a orientação sexual de Hoover teria influenciado nas ações persecutórias?  Como dissemos, Weiner descarta essa questão, como fantasia.

    Do meu ponto de vista, pois o debate se perdeu entre as caricaturas formadas sobre Hoover. As perseguições políticas ou motivadas por questões morais não são parte de uma escolha individual de quem ocupe um lugar de poder (e no caso de Hoover um destacado lugar de poder!). As medidas tomadas pelo Estado contra um grupo social devem ser explicadas pelo contexto social, muito mais do que por uma “pseudo psicologia de boteco”! Aqui, pontos para o autor, por saber inserir a figura pública no contexto histórico (o que é sempre muito complicado!)

    Por fim! 

    O livro começa com um dilema clássico nas Ciências Políticas: liberdade individual x segurança coletiva. Um dilema que perseguiu todos os pensadores políticos e todos aqueles que ocuparam lugar de poder no Estado. Um dilema que sempre se coloca quando o Estado precisa de órgãos de segurança e inteligência, como FBI.

    Quais são os limites do poder de vigilância? O que é legítimo em nome da segurança? A leitura do livro nos coloca o tempo todo, essa questão. Obviamente que o autor, claramente um liberal, não resolve, mas conhecer a trajetória do FBI, e em particular os dilemas de Hoover, nos ajuda a refletir, principalmente neste tempo em que temos a invasão do privado e dos escândalos de  espionagem, por um lado, e por outro o trauma dos atentados terroristas. Eis os desafios para a sociedade americana e para o próprio FBI.

    J. Edgar Hoover no Cinema.

    Interessante observar a diferença, sobre a questão da homosexualidade, abordada no filme J Edgar, dirigido por Clint Eastwood e com Leonardo DiCaprio no papel principal. O filme assume a versão de que Hoover era homosexual, embora não coloque cenas explícitas do relacionamento.

    Uma cena que nos chama a atenção é a que os dois vestidos em roupão entram em uma briga violenta em um hotel. Este episódio é relatada em diferentes biografias de Hoover, mas Weiner a descarta como verídica. No filme a parte mais explícita do suposto relacionamento de Hoover com seus principal assistente.

    Novamente é preciso dizer que se Hoover era homosexual ou não seria uma questão privada do que pública! Se não fosse o fato de o FBI nas primeiras décadas de atividade não tivesse articulado uma perseguição sistêmica aos homosexuais.

    • Leia também a obra do mesmo autor sobre a CIA (Aqui)
  • Inimigos: uma História do FBI

    Inimigos: uma História do FBI

    Por Dr. Erick Reis Godliauskas Zen

    Twitter: @erickrgzen

    • Tim Weiner. Enemies. A History of the FBI.  New York, Random House, 2012.
    • sobre Tim Weiner
    • uma estimulante pesquisa
    • as polêmicas entorno de Edgar Hoover
    • Filme J Hoover de Clint Eastwood

    O livro Inimigos: Uma História do FBI, de Tim Weiner, é uma obra estimulante e instigante que busca traçar um amplo histórico do FBI, desde a sua fundação até o ataque  terrorista de 11 de setembro, além de apontar alguns dos problemas atuais da instituição e do sentimento de fracasso que se abateu sobre todos os órgão de inteligência americanos, após o ataque às Torres Gêmeas.

    O jornalista Tim Weiner é um autor reconhecido e premiado. Recebeu o Pulitzer (o principal prêmio nos EUA) pelo livro Legacy of Ashes, um livro dedicado a analisar a CIA. Durante anos, ele foUnknowni correspondente do jornal New York Times (entre outros) cobrindo a CIA e se tornou um especialista em temas relacionados a inteligência. Ao contrário dos jornalistas brasileiros, muitos jornalistas americanos, mesmo entre os conservadores, são capazes de realizar habilidosas e competentes pesquisas históricas e, eis aqui, um bom exemplo.

    Uma  característica importante do trabalho de pesquisa do autor foi a utilização somente de materiais, documentos, “desclassificados” e, portanto de acesso público. Isso permite que o leitor interessado, como eu, busque as fontes sem dificuldades. Claro, que essa forma de trabalhar só é possível quando há uma política de arquivos (que não é perfeita, mas é melhor do que a nossa). Esse procedimento evita, também, as especulações, o uso de fontes ocultas e inventadas, como muitas vezes já vimos por essas terras.

    A narrativa proposta por Weiner é organizada de forma cronológica e o livro é dividido de acordo com a administração, ou seja, o presidente que governava. Esse é um procedimento clássico na história e no jornalismo norte-americano. Essa característica reforça um dos pontos fortes do livro: como cada presidente americano lidou com os órgão de segurança? Assim, somos informados sobre os dilemas de Roosevelt, os usos e abusos de  Nixon, a desconfiança com relação aos democratas, em particular Kennedy, e Clinton que deixou o FBI à míngua em termos de recursos.

    Quem foi Edgar Hoover? 

    Nessa relação entre a instituição e os presidentes a principal figura, e não poderia ser diferente, é John Edgard Hoover, pois foi ele foi o primeiro diretor do FBI e permaneceu no cargo de 22 de março de 1935 até 2 de maio de 1972, quando faleceu.  Portanto, dirigiu o FBI por 48 anos! (vou concentrar este post neste aspecto). Interessante notar que em um país com alternância democrática na presidência, um dos cargos mais importantes dentro da segurança de Estado tenha experimentado tamanha estabilidade.

    John Edgar Hoover, nasceu em Washington D.C em janeiro de 1895 e quando entrou nas forças policiais, enfrentava sobretudo as “ameaças” internas, os anarquistas, que haviam realizado diversos atentados nos EUA, e posteriormente os comunistas. Sem esquecer do combate ao crime organizado, que foi o que levou Hoover a fama. Após a Segunda Guerra Mundial foi Hoover quem preparou o FBI para enfrentar a Guerra Fria e, claro, o crime organizado.

    A análise e caracterização de Hoover realizada por Weiner é muito intrigante. O autor demonstra que o diretor do FBI era capaz de odiar igualmente qualquer coisa que demonstrasse uma ideologia… Que demonstrasse rejeição ou que se diferenciasse do “sonho americano”, dos “valores americanos”. Assim, perseguiu violentamente, e muitas vezes usando recursos ilegais: anarquistas, comunistas, o movimento negro, hippies,  mas também os movimentos racistas como a Ku Klux Klan e os movimentos que pregavam (ainda pregam) a supremacia ariana. Alguns dos seus “inimigos” foram personalidades públicas, como Luther King… e por aí vai!

    Outra característica de Hoover era o seu personalismo. Em muitos casos tratava pessoalmente das operações e mantinha um arquivo próprio de informações. Em muitos documentos as instruções e as comunicações eram realizadas com um E. H., na borda, indicação clara de quem dera a instrução e como deveria ser seguida.

    Hoover homossexual?

    Um ponto polêmico do livro é a análise da relação entre Hoover e seu principal assistente: Clyde Tolson. Na literatura recente sobre Hoover encontramos de forma explicita e / ou  sugerida a homossexualidade de Hoover e os dois são frequentemente descritos como amantes. Esse aspecto foi explorado em algumas biografias e até no cinema. Tim Weiner descarta essa ideia, para o autor, Hoover não manteve relações sexuais com Tolson ou com “qualquer outro ser vivo”. Assim, para ele, Hoover era “assexuado” (palavra minha e não do autor). Parece um argumento estranho, para dizer o mínimo, porém a visão de Weiner sobre o contexto da sociedade americana é mais interessante do que qualquer argumento sobre esse aspecto. Afinal, cabe questionar: Qual é a relevância desse fato (se foi um fato)?  Qual a relevância em se saber se o diretor do FBI era ou não homossexual? Não seria esta uma questão secundária? Uma questão privada para além das ações públicas de Hoover?

    Seria! Ocorre que entre as páginas mais obscuras da história do FBI está a de uma ampla perseguição aos considerados “desviados” sexualmente. Neste “desvio”, os principais “inimigos” foram os homossexuais e as prostitutas. Assim, o debate (se é que é um debate) seria até que ponto a orientação sexual de Hoover teria influenciado nas ações persecutórias?  Como dissemos, Weiner descarta essa questão, como fantasia.

    Do meu ponto de vista creio que o debate se perdeu entre as caricaturas formadas sobre Hoover. As perseguições políticas ou motivadas por questões morais não são parte de uma escolha individual de quem ocupe um lugar de poder (e no caso de Hoover um destacado lugar de poder!). As medidas tomadas pelo Estado contra um grupo social devem ser explicadas pelo contexto social, muito mais do que por uma “pseudo psicologia de boteco”! Aqui, pontos para o autor, por saber inserir a figura pública no contexto histórico (o que é sempre muito complicado!)

    Por fim! 

    O livro começa com um dilema clássico nas Ciências Políticas: liberdade individual x segurança coletiva. Um dilema que perseguiu todos os pensadores políticos e todos aqueles que ocuparam lugar de poder no Estado. Um dilema que sempre se coloca quando o Estado precisa de órgãos de segurança e inteligência, como FBI. Quais são os limites do poder de vigilância? O que é legítimo em nome da segurança? A leitura do livro nos coloca o tempo todo, essa questão. Obviamente que o autor, claramente um liberal, não resolve, mas conhecer a trajetória do FBI, e em particular os dilemas de Hoover, nos ajuda a refletir, principalmente neste tempo em que temos a invasão do privado e dos escândalos de  espionagem, por um lado, e por outro o trauma dos atentados terroristas. Eis os desafios para a sociedade americana e para o próprio FBI.

    J. Edgar Hoover no Cinema.

    Interessante observar a diferença, sobre a questão da homosexualidade, abordada no filme J Edgar, dirigido por Clint Eastwood e com Leonardo DiCaprio no papel principal. O filme assume a versão de que Hoover era homosexual, embora não coloque cenas explícitas do relacionamento.

    Uma cena que nos chama a atenção é a que os dois vestidos em roupão entram em uma briga violenta em um hotel. Este episódio é relatada em diferentes biografias de Hoover, mas Weiner a descarta como verídica. No filme a parte mais explícita do suposto relacionamento de Hoover com seus principal assistente.

    Novamente é preciso dizer que se Hoover era homosexual ou não seria uma questão privada do que pública! Se não fosse o fato de o FBI nas primeiras décadas de atividade não tivesse articulado uma perseguição sistêmica aos homosexuais.

    De toda forma, vale conferir o filme também. Eu assisti pela Netflix.

    • Se você GOSTOU deste artigo inscreva o seu EMAIL para receber atualizações
    • Leia também a obra do mesmo autor sobre a CIA (Aqui)
    • Acompanhe a nossa página no Facebook
    • Conheça nosso canal no YouTube.