Categoria: política

  • Ucrânia: os erros de Putin

    Ucrânia: os erros de Putin

    Quando a agressão à Ucrânia teve início, as expectativa era que essa seria uma guerra rápida e a vitória da Rússia inevitável. Hoje, vemos um Putin derrotado, ao menos nos seus propósitos mais megalomaníacos de ocupação da Ucrânia.

    Mas quais foram os erros cometidos por Putin e seus seguidores?

    Preparei uma  lista deles:

    1 – Visão de mundo.  A invasão da Ucrânia é a consequência de uma visão de mundo sustentada pelo presidente Putin  e  seus seguidores. Nessa visão, a Rússia teria sido propositadamente fragilizada e ignorada, com o fim da União Soviética, o que daria legitimidade à ocupação da Ucrânia, como seu “espaço vital”, para usar as palavras dos propagandistas.

    2 –  Considera a  identidade nacional da Ucrânia uma  artificialidade. Nas suas peças de propaganda, buscava sempre associar o sentimento nacional ucraniano ao extremismo nazista, o que o levou a  duvidar da resistência ucraniana.

    3 – A ilusão de que os ucranianos que se identificam etnicamente como russos (que falam russo) aderiram às políticas do Kremlin. Ilusão compartilhada pelos russófilos de plantão.

    4 – Declínio do  Ocidente. A difusão da ideia de que o mundo vai ser governado por uma  aliança asiática. Assim, a União Europeia é apresentada como uma instituição frágil, incapaz de manter uma política própria e independente. A OTAN, como uma aliança que, apesar da sua expansão anti-russa, não conseguiria garantir mais a segurança dos seus membros e da Ucrânia. Aqui temos três avaliações erradas. 

    5 – Acreditar que por fornecer matéria prima, sobretudo o gás, para a Europa, essa seria incapaz de reagir. A reação foi brutal. As sanções, ao contrário das de 2014, provocaram danos na economia russa, que de aliada passou a ser dependente da China. Já a Europa, passo a passo ruma a outros fornecedores de gás petróleo, deixando a Rússia isolada. 

    6 –  A supremacia do Exército Russo. A propaganda russa, sobretudo aquela difundida pela RT e Sputnik, sempre mostraram as forças armadas russas, como modernizadas e eficientes. Imagem essa valorizada pela atuação na Síria. Como vemos, as ações militares foram ineficientes ao ponto de exigirem mudanças nos objetivos da guerra. Analistas apontam que a corrupção destruiu parte das forças russas, completamente despreparadas.

    7 – A irmandade com os ucranianos. Dentre as bobagens propagadas, a de que a Rússia evitaria a força total para não massacrar um povo com laços  históricos em comum foi a maior delas. Diante das derrotas russas, não foi possível esconder os massacres cometidos pelas forças russas. Essa irmandade não existe! Não existe ocupação imperialista civilizada. 

    8 – O desprezo do papel da Europa central e do Norte, como agentes na geopolítica. Polônia, países bálticos e escandinavos reagiram de forma dura e solidária a Ucrânia e passaram a exercer pressão tanto na União Europeia, quanto na Otan (com a já anunciada adesão da Finlândia e da Suécia), para ações mais decisivas, empregaram recursos vultosos, se abriram para abrigar a onda de refugiados, além de sistematicamente denunciarem a Rússia e os crimes cometidos. Assim, se tornaram protagonistas na geopolítica, deixando para trás as políticas francesas e alemãs.

    9 – A rebeldia da Belarus. Depois dos protestos dos anos anteriores, a Belarus pareceu totalmente dominada pela Rússia, mas uma coisa é domesticar o seu ditador, a outra a  sociedade civil. O que vimos na Belarus foram atos de sabotagem e resistência que dificultaram as operações russas a partir do país, ainda, satélite.

    10 – Desprezar Zelensky, enquanto liderança. Ao pressupor na fragilidade de Zelensky, a Rússia desprezou a sua capacidade de articular a resistência. Tomado como palhaço, se esqueceram de que, como  homem de mídia, ele conseguiu recriar a sua imagem e se colocar à frente do processo, fragilizando o discurso russo com relação à Ucrânia. Se Zelensky está longe de ser o herói propagado pela mídia ocidental é necessário reconhecer que  ele ganhou a mídia, gerou mobilização, se  apresentou como resistência. Em outras palavras, ao contrário da esperada fuga, ele se apresentou como resistência. 

    Diante de tantos erros, restou a Rússia a se tornar auxiliar em regiões já  em disputa e usar da chantagem nuclear para não reconhecer a vexaminosa derrota.

  • Putin e a Esquerda: Tirando o Urso da Sala

    Putin e a Esquerda: Tirando o Urso da Sala

    Nos últimos dias, com a invasão da Ucrânia ordenada por Putin, uma série de debates tem ocorrido pela mídia e pelas redes sociais. Nelas, influenciadores da esquerda tem diretamente defendido a Putin, ou usando um frágil “doisladismos”, para criticar a Otan e Putin, ao mesmo tempo. Em meio a guerra, Putin se tornou um urso na sala. Como isso pode ter acontecido?

    No final da década de 1990 e início de 2000, o desespero com o avanço do neoliberalismo chegava ao desespero. O Brasil fez a maior dívida da história do capitalismo (até então) para não quebrar, a Argentina quebrou! 

    Tínhamos medo de mais um governo neoliberal, da ALCA, quem não gritou “Alcaralho” com o FMI, não era gente! A ideia de um mercado único é devastador para as economias da A.L era uma ameaça e sentíamos o seu efeito devastador. 

    Com isso, a esquerda se aliou a qualquer coisa que se opusesse ao neoliberalismo. Foi assim que a esquerda se aproximou do militar Chávez, dos Kirchners, da China e de Putin e esse PT (meia bomba) da Carta ao povo Brasileiro. 

    Era a ideia de um movimento contra hegemônico, absolutamente necessário. Fechamos os olhos para os defeitos e problemas como uma aliança  contra uma desgraça que era (é) cotidiana. E não estava errado! Aqui não é exercício de meia culpa. Era o que tinha que ser feito e pronto! 

    O problema é que a história não fica parada e logo os defeitos, para os quais fechamos os olhos, porque já estavam lá, nos jogaram no pesadelo que vivemos. Uma China dominante, uma ditadura do Maduro, o personalismo e fracionamos do Peronismo, um Putin autoritário, homofóbico, expansionista. Agora temos que fazer a pergunta preferida da direta: E o PT hein?

    Bom, depois de três mandatos e poucos, com todas as políticas sociais e um momento de crescimento econômico, o PT não foi capaz de superar a lógica neoliberal. Ele foi uma espécie de tampa de bueiro. Quando tiraram a tampa, a sujeira e as baratas saíram para festa. Enfim, o PT continua meia bomba, agora propõem voltar ao poder com Alckmin e tudo…

    Daí temos duas possibilidades: brigar e fechar os olhos com o que está na nossa cara ou entender o processo e pensar outros caminhos. Esses caminhos podem demorar para aparecer, por agora seguimos tentando evitar o pior. Nesta busca por tentar evitar o pior, deveríamos ter aprendido as lições do começo do século e não pretender defender o indefensável.

  • Refugiados: Uma Questão Global.

    Refugiados: Uma Questão Global.

    A imigração é um direito humano! E a necessidade de buscar uma nova vida, ou simplesmente sobreviver, deve ser entendida como parte da liberdade a ser protegida. As razões para que um indivíduo busque outro país ou território para viver variam de acordo com o contexto histórico e situações locais específicas. 

    Podem ter relação com problemas econômicos, sociais, violência, guerra, invasões, entre outros. Na lista de questões que existem, ainda devemos incluir as mudanças climáticas. Essas situações levam à violação sistemática dos direitos humanos e a busca, mais do que legítima, e necessária, de refúgio. O direito ao refúgio é o direito à vida.

    Com a pandemia, houve no ano passado, um apelo global para o cessar fogo! Ou seja, uma apelo à paz, para que, em meio a emergência sanitária para tentar reduzir os problemas existentes. Contudo, o apelo não foi capaz de diminuir o número de refugiados, pelo contrário, ele cresceu em 4%.  

    Os Refugiados em Números.

    Ao contrário do que poderia ser imaginado, a pandemia provocado pela Covid-19 não reduziu o número de pessoas que buscam refúgio, pelo contrário, atualmente contamos com 82, 4 milhões de pessoas de acordo com a ACNUR, A Agência da ONU para os Refugiados no relatório Tendências Globais. 

    No final de 2020, a ACNUR tinha sob a sua tutela 20,7 milhões de refugiados. A origem e razão dos que se encontram nessa condição variam. Entre os grupos mais numerosos vale chamar a atenção para os 5,7 milhões de refugiados palestino, encontramos o resultado das políticas de Israel e os 3,9 milhões de venezuelanos, provocados pelo (des) governo de Maduro. 

    A grande maioria dos refugiados, 86%, se encontram em países vizinhos, tanto devido à facilidade de escapar, mas também pela expectativa de retorno. Os países que mais recebem refugiados são: a Turquia (pela sétima vez), Colômbia, Paquistão, Uganda e Alemanha.

    Considerando os números atuais, chama a atenção o número de menores de idade entre os refugiados, pois eles compõem 42% do total de refugiados. Como refugiados, quase um milhão de crianças nasceram entre 2018 e 2020. São crianças que podem passar anos até ganharem um novo lugar ou poderem voltar ao local de origem dos seus pais. 

    Instabilidade e refugio.

    Em sua maioria, podemos observar, que governos não democráticos e situações de autoritarismo e conflito, são os responsáveis pelo grande número de refugiados. Dos deslocados, dois terços são de apenas cinco países: Síria, Venezuela, Afeganistão, Sudão do Sul e Miammar. Países que passam por situação de guerra, conflito interno, crise e golpe de Estado. O autoritarismo e os conflitos levou a que 4,1 milhões de pessoas pedissem asilo

    A falência do Estado, como no caso da Venezuela, também chama atenção, pois muitos países não reconhecem a condição de refugiado dos venezuelanos e esses números devem ser ainda maiores. Além disso, há o caso já duradouro dos palestinos que há décadas figuram entre o maior número de refugiados e, lamentavelmente, não parece haver uma melhoria de condições no horizonte próximo. 

    As guerras civis, declaradas ou mascaradas, ainda causam o problema dos refugiados internos, pessoas que se veem obrigadas a abandonar as suas regiões dentro de um país. No total, esses somaram em 2020,  3,2 milhões de pessoas, sendo os principais países: Etiópia, Sudão, Moçambique, países do Sahel, Iêmen, Afeganistão e Colômbia.

    Um problema global. 

    Atualmente 1% da humanidade se encontra na condição de refugiado. Esse é um problema que, infelizmente, tende a permanecer e ainda ganhar outros motivos para além dos políticos, como será o caso dos refugiados climáticos, sobretudo, porque ainda precisam ser reconhecidos como tal. 

    Nesse momento, relembrando os 70 anos da Convenção de 16 de junho de 1951, é necessário repensar essas questões. Tanto para defendermos a dignidade humana e atuar contra a sua violação sistemática, quanto para pensarmos que na atualidade será necessário uma redefinição de refugiados, incluindo novos problemas que a humanidade enfrenta. 

    Fonte: https://www.acnur.org/portugues/2020/06/18/relatorio-global-do-acnur-revela-deslocamento-forcado-de-1-da-humanidade/

  • Os lituanos na Guerra Civil Espanhola

    Os lituanos na Guerra Civil Espanhola

    Os lituanos na Guerra Civil Espanhola lutaram contra o fascismo . Em julho de 1936, a Espanha entrou em Guerra Civil, quando o General Franco articulou um golpe de Estado derrubando o governo democraticamente eleito, dando início a uma ditadura. Os republicanos resistiram e, junto com as forças de esquerda, reunindo os anarquistas e comunistas, passaram a enfrentar o ditador.

    O ditador Franco buscou ajuda militar na Alemanha nazista e na Itália fascista. Os ditadores enviaram tropas “voluntárias”, assim como forneceram aviões e submarinos reforçando as forças franquistas. A ajuda militar resultou em tragédia, como o bombardeio da cidade de Guernica e Madrid.

    Do lado Republicano, a ajuda internacional também foi grande. Os movimentos antifascistas prestaram solidariedade aos combatentes republicanos. Em diversos países do mundo, notadamente na América Latina como na Argentina e em Cuba, voluntários foram mobilizadas. Desta solidariedade, grupos de esquerda se dirigiram para a Espanha e se engajaram no conflito.

    Dentre os grupos de esquerda, o mais numeroso foi organizado pelos comunistas, com o apoio da União Soviética e da Internacional Comunista. Os comunistas formaram as chamadas Brigadas Internacionais, em outubro de 1936, que chegaram a contar com quarenta mil membros.

    Os Imigrantes Lituanos na Guerra Civil

    Os imigrantes lituanos na América, que já participavam de organizações antifascistas, pois consideravam como fascista o governo lituano de Antanas Smetona, se engajaram no movimento. Os lituanos começaram a difundir a propaganda pela mobilização antifascista primeiro na América do Norte e posteriormente na América do Sul.

    A mobilização entre os lituanos reuniu voluntários para lutar na Espanha. Da Argentina, vinte e três lituanos foram combater na Espanha. Outros três da América do Sul se juntaram a eles, sendo dois do Uruguai e um do Brasil.

    Entre os lituanos radicados no Brasil, a mobilização foi menor, principalmente porque o Partido Comunista Brasileiro (PCB) estava na ilegalidade devido ao movimento (Intentona) de 1935. Assim, a difusão e mobilização de voluntários era bastante difícil, pois muitos lituanos comunistas estavam nos calabouços de Getúlio Vargas naqueles anos.

    Meu livro

    No meu livro Identidade em Conflito em dediquei um capítulo inteiro a mobilização antifascista dos lituanos na América do Sul. Vale você conhecer essa atuação dos lituanos. Aqui

  • A política não é mais sobre entender. É sobre sentir.

    A política não é mais sobre entender. É sobre sentir.

    A política não é mais sobre entender. É sobre sentir! Esse título é uma provocação, mas me acompanhe, por favor. Vejo a maior parte dos meus amigos inconformados, e sou solidário a eles, com toda essa irracionalidade e estupidez que nos cerca nesses dias difíceis. Justo! Mas observe. Vocês estão reagindo fazendo campanhas de esclarecimento. Oferecendo argumentos racionais para lidar com o que aparece como irracional.

    No entanto, e eis a questão, a política nesse tempo de radicalismo está sendo guiada pelo sentir e não pelo pensar. Por isso, os argumentos racionais estão batendo em uma parede impenetrável. Eu sei que a política sempre foi carregada de sentimentos, mas o que temos aqui é que a mídia, as novas formas de comunicação, trabalham com o sentir e não mais com o pensar.

    Sentimento e mídia

    Hoje, a televisão não te diz mais o que você deve pensar, mas o que você deve sentir. Vocês devem se lembrar quando os Titans cantavam: “a televisão me deixou burro, muito burro de mais”, pois bem! Agora, a televisão não te deixa burro, ela te deixa paranóico, histérico, sentimentaloide, amedrontado… A televisão, hoje, trabalha com o pavor e não mais com a ignorância. O mesmo para todas as outras mídias e formas de comunicação.

    Portando, os gráficos, esquemas, longas explicações que apelam à razão não chegam naqueles que estão mobilizados por sentimentos. Por isso, o líder carismático, pode fazer um discursos totalmente irracional e sem coerência interna nenhuma, se uma ou duas frases desse discurso mobilizarem sentimentos. Ele te diz o que você deve sentir!

    Assim, a análise do discurso do líder carismático deve buscar essas frases, esses pontos e não a sua lógica ou a coerência. Observe os apelos a libido, ao medo, ao ódio e sobretudo a sexualidade (que é uma sínteses de tudo isso), que pode ser simplificado na frase:

    – “Você vai virar viado!”

    A Política e o medo. O medo da política

    Nos momentos de medo, frustração, isolamento, tédio, ansiedade, etc. Esses apelos sentimentais são ainda mais ressonantes. O medo é o sentimento mais fácil de ser mobilizado. É o mais irracional! Por que?Porque o medo foi fundamental para que nós nos tornássemos a espécie dominante. O medo é parte de nós. Nós assumimos sempre a pior hipótese. É parte do nosso cérebro:

    Se o mato está se mexendo é melhor que você assuma que ali tenha uma onça. Se não tiver você só gastou energia para correr. Se for uma onça você teve chance de se salvar. Se você assumir que é vento e tiver uma onça você está morto! Assim, sobrevivemos! Assumindo que sempre há uma onça. Mas o medo, tão nosso, pode ser manipulado e estimulado se alguém ficar gritando: onça, onça. E digo mais: Onça! Você sempre vai correr.

    Ao aprender a manipular medos e sentimentos, as redes sociais, mídias e aqueles que aprenderam a lidar com ela souberam estimular o medo. Vivemos com medo e o medo não permite ser analítico. O medo supera a análise! Quais medos?Medo de se descobrir gay, vai ter o machão! Medo de ser governado pelo desconhecido, medo de ter que viver outra forma de vida, medo de morrer sem entender o motivo…

    O desafio é como quebrar esse medo? Como superar essa irracionalidade estimulada pelo medo? Eu proponho que a forma de não sentir medo é pela revolta! Sejamos revoltados.

  • Hiperinflação: uma memória quase afetiva.

    Hiperinflação: uma memória quase afetiva.

    Para quem nasceu depois do período de hiperinflação, eu quero compartilhar como era viver nesse mundo, usando minha memória quase afetiva. Afinal, “a distinção entre passado, presente e futuro é apenas uma ilusão teimosamente persistente”, diria Albert Einstein.

    A hiperinflação na minha infância.

    1 – Quando tinha idade suficiente para comprar na cantina da escola, minha mãe me dava uma nota de 100 (não lembro a moeda) na primeira semana, com ela, eu comprava um salgado, um “refri” e vinte balinhas (aquela vermelha embrulhada em papel prateado). Eu enchi o bolso de balinhas me sentia rico por isso. Na semana seguinte, com os mesmos 100, vinham dez balinhas e na outra cinco… No final do mês, minha mãe me dava uma nota de 100 e uma de 50 e só dava comprava o salgado o “refri” e sete balinhas. Enfim, nunca mais enchi os bolsos de balinhas.

    2 – Como os preços mudavam quase todo dia, e na época eram marcados com etiqueta no produto, o supermercado virava uma caça ao tesouro. A aventura era buscar as latas que estavam com preço “antigo”. Aí você enfiava a mão na prateleira e ficava buscando as latas lá no fundo. Eu era “pró” em achar lata de pêssego em caldas e achocolatado, com preço antigo.

    3 – Quando meus pais recebiam o salário, saiamos como doidos para fazer compras, já que no outro dia poderia estar mais caro, e dependendo da época faltar produtos. Pena que tudo mundo fazia a mesma coisa. Os supermercados tinham filas enormes e pessoas com dois três carrinhos, comprando tudo o que dava no mesmo dia. Alguns supermercados limitavam um carrinho por pessoa, mas aí as famílias inteiras se aventuravam nos supermercados. Era o dia do supermercado.

    4 – Fila da Coca-Cola era outro problema e quando tinha promoção dobrava! Dobrava, triplicava. Eram as garrafas de vidro em

    Na Casa da Classe Média

    5 – A galera da classe média tinha freezer em casa. Tinha um freezer que era um pouco menor que a geladeira. E tinha (mais chic) a geladeira com duas portas. Porque você tinha que comprar tudo de uma vez, então você comprava toda a mistura do mês (as vezes de dois meses) e congelava. Era um tal de congelar carne moída, salsicha (sim salsicha!) e frango. O Freezer tinha que estar cheio, porque como energia custa, só é viável se ele estiver todo cheio.

    6- Naquele período de hiperinflação também houve, na classe média, a acessibilidade ao microondas. Então, eram um tal de congelar no freezer e descongelar no microondas. Até pão! Sim, pão…

    7 – Combustível também era um problema. Os carros consumiam muito na época e era gasolina ou álcool. As filas se espremiam pelas avenidas até chagar no posto. Alguns com preços suspeitos, muito suspeitos. Mas tanque cheio e ir equilibrando no mês era fundamental para “chegar ao fim do mês”.

    E Se Não Fosse o Humor…

    8 – O gatilho salarial era quando o acumulado da inflação chegava em 20%, os salários eram automaticamente reajustados. Ou seja, basicamente você diminuía o consumo da galera e quando estava prestes a matar o consumo (e as pessoas de fome) você reajustava o salário em uma pancada. Óbvio que deu errado, porque quando o salário era reajustado todo mundo reajustava tudo e a inflação ia para a lua.

    Para fazer piada, com o que já era piada, Jô Soares, que tinha um quadro que chamava O Jornal do Gordo um “jornal para as pessoas mais ou menos surdas”. Um comediante lia a notícia e o Jo interpretava de forma distorcida com gestos e objetos. Daí liam a noticia lá: “De acordo com o Ministro fulano o gatilho vai disparar nesse mês.”Eu o Jo saia berrando: “o gatilho! O gatilho vai disparar” e puxava uma arma e sai dando tiro “vai disparar o gatilhooo! “ Melhor que essa era só o: “Bota ponta Tele!”(Sim na época ainda se jogava futebol com ponta esquerda e ponta direita)

    Jornal do Gordo.

  • Biden e a Esquerda: o caminho para a decepção.

    Biden e a Esquerda: o caminho para a decepção.

    Não temos a menor dúvida de que o embate entre Trump e Biden será fundamental para os rumos da política em escala global. De forma até exagerada se enxerga um embate entre a civilização e a barbárie, ou entre a democracia e a demagogia (populismo) autoritário. Por essa razão, a esquerda, com excessões, tem se entusiasmado com a provável vitória do candidato Democrata, Joe Biden.

    No Brasil, a esquerda, particularmente a militante de partido, torce muito, pois entende que essa vitória fará o que ela não consegue fazer: derrubar, ou ao menos fragilizar, o atual governo. Para nós, Biden é o caminho certo para a decepção da esquerda, em todos os lugares.

    Nós sabemos quem é ele

    Os pensadores de esquerda nos Estados Unidos, seja aqueles que atuam junto aos Democratas ou não, sabem quem é o político pragmático, negociador e centrista Joe Biden. Bastaria lembrar que ele foi escolhido para ser vice de Obama como uma forma de acalmar o status quo Democrata diante do “radicalismo” que representava as propostas apresentadas Obama (“Yes, We can”) e a candidatura de um negro para a Casa Branca. Quando Obama superou a Hillary Clinton, Biden era, naquele momento, a certeza do equilíbrio e da manutenção do status quo para os Democratas e seus eleitores.

    Por essas características, muitos prefeririam ter lançado ele e não Hillary, em 2016. No entanto, devido a uma tragédia pessoal, Biden preferiu não se candidatar. Em 2020, nesse ano complicado, ele apareceu novamente como essa figura estável e conciliadora, incapaz de sustentar qualquer dogma ou algo que não possa ser mudado de acordo com a conveniência do momento, dentro dos parâmetros estabelecidos pelos Democratas.

    É mais fácil…

    Essa visão fica evidente, no apoio, com ressalvas, que recebe de Bernie Sanders (ver meu artigo de 2016). Sanders sempre afirma ter diferença com Biden, mas ressalta saber que ele é um homem decente, que respeita as regras do jogo e que respeita principalmente “a democracia”, entendendo a democracia aqui como o sistema eleitoral / legal dos Estados Unidos.

    Assim, a esquerda americana está dizendo para quem queira escutar: “é mais fácil sobreviver no neoliberalismo formalmente democrático regido por Biden do que caminhar para uma nova forma de fascismo, com um demagogo, autoritário, megalomaníaco. Por isso, vote em Biden e é só isso mesmo!”

    Nas suas atitudes e nos debates, Biden fez questão de jogar baldes de água fria na esquerda que atua entre os Democratas e foram muitos os baldes… Vamos a alguns exemplos.

    Um grande balde de água fria é a estratégia de atrair os Republicanos que se afastaram de Trump (ou do trumpismo). Entre eles, o governador Republicano de Michigan Rick Snyder que responde pela acusação de ser o responsável pela contaminação da água da cidade de Flint. (ver aqui). Os movimentos sociais estão há anos lutando contra ele e seu governo.

    A água fria nos debates

    Nos dois debates, Biden jogou vários baldes de água fria na esquerda. Alguns deles foram bem discretos. No primeiro, marcado pelo caos, uma questão passou quase desapercebida: a do Green New Deal. Lembrando: essa é a proposta da esquerda Democrata para que os EUA se tornem uma economia verde. Durante o debate, Biden afirmou que ele não implantará o programa denominado Green New Deal, mas na plataforma dele estava lá. Em suma: ele afirmou que não implementará a principal bandeira da esquerda que vinha com Sanders.

    No segundo debate, sem usar a expressão Green New Deal, ele retomou o tema, usando a palavra “transição”, ou seja, na cabeça dele, é possível passar para a economia verde sem perder a os investimentos e afetar os empregos no carvão e no petróleo, por exemplo. Será?

    De toda forma, ele tentou agradar a esquerda sem desagradar aos que dependem ainda das outras formas de atividades econômicas. Obviamente, Trump tentou associar a isso a uma forma de socialismo, o que não deu certo. Ainda assim, logo após os debates, os Democratas ligados a sua campanha saíram em defesa da indústria do carvão e do Petróleo, nada de Green New Deal, portanto.

    No mesmo debate, Biden, ao ser associado aos projetos de Sanders por Trump, lembrou que ele não é socialista! E foi além! Lembrou que ele é Biden! O que derrotou os outros projetos! (não tinha conciliado?) E isso quando respondia sobre saúde. Em outras palavras, Biden descartou aderir ao programa de saúde pública e para todos, como pretendia Sanders. O mesmo, vale dizer, para a educação. Ou seja, os projetos de Sanders, representantes dos Democratas socialistas foram todos descartados!

    Biden e o Brasil

    A esquerda brasileira também não deve nutrir ilusões com relação a Biden. Primeiro, porque o Brasil e continuará a ser estratégico independente dos governos nos dois países. Segundo, porque a luta contra o avanço da influência da China é a única coisa que unifica os dois partidos e nisso, o Brasil, ainda está em disputa. Assim, o que veremos é uma mudança da forma, mas não o abandono do país nas relações estratégicas, como isso será articulado com o bolsonarismo é que é a questão.

    Os Democratas costumam oferecer vantagens aos países que querem manter boas relações, ou manter o diálogo aberto. O provável, nessa relação, entre crítica e oferecimento de vantagens, é que Biden vai buscar atuar. O efeito no Brasil, para o bolsonarismo, talvez seja mais forte no aspecto simbólico e de perda de narrativa do que de uma ação direta do governo americano. Aqui é preciso lembrar que grande parte dos investimentos estrangeiros já saíram do país. Assim, é pouco provável que o governo Biden faça aquilo que a esquerda brasileira não está conseguindo fazer…

    Com Biden… Estaremos mais confortáveis

    Em todos os cantos do mundo, em todas as alas progressistas há uma torcida por Joe Biden. Ela vai durar até o dia da sua vitória (se ela se confirmar). No dia seguinte, já ficou obvio, que ele não fará um governo de esquerda e nem mesmo progressista. Não vai assumir os compromissos de Sanders e dos Democratas Socialistas que tanto lutaram para o eleger.

    A esquerda nutre a ilusão de que é mais fácil lutar dentro das regras do jogo liberal democrática do que contra as forças que trouxeram Trump ao poder. Mas será mesmo? Se fosse fácil derrotar o neoliberalismo ela já teria conseguido. Teve oportunidades em todos os continentes e não foi o neoliberalismo o derrotado. O Brasil é um ótimo exemplo disso. Talvez a esquerda esteja apenas mais confortável no neoliberalismo.

    Nele, a esquerda, pode livremente adotar bandeiras novas, movimentos novos, fazer longos discursos e manifestações. Pode ainda publicar os seus livros, podcasts, canais no youtube, blogs (como esse) e manifestos. Pode ainda louvar e se acostumar com as derrotas e ver nela um princípio moral, quase cristão, “sou perseguido e injustiçado, por isso estou certo”…. Mas a esquerda, na sua zona confortável, nunca derrotará ninguém. Ainda assim, espero que a esquerda americana resolva sair de casa e votar em Biden.


  • Belarus: eleição e crise na última ditadura da Europa

    Belarus: eleição e crise na última ditadura da Europa

    • Crise na Belarus
    • História da Belarus
    • Relação com a União Europeia e a Rússia

    As eleições na Belarus provocaram uma onda de protestos jamais vista naquele país. Manifestações essa que colocam contra a parede o regime que é considerado como a última ditadura da Europa. Neste texto vamos abordar brevemente a História da Belarus e o processo político atual.

    A República da Belarus

    A Belarus teve breve períodos de independência como Estado nacional moderno. Durante a Revolução Russa de 1917, a Belarus teve um breve momento de independência, quando se formou um Congresso que declarou a independência da Republica Popular da Bielorrússia, em março de 1918. No entanto, ela foi ocupada pelas tropas alemãs, mais tarde foi tomada pelo Exército Vermelho e integrada a União Soviética, como uma de suas repúblicas.

    Em março de 1990, com a crise da União Soviética, a oposição começou a ganhar espaço com a formação do Front Popular. Em 27 de julho de 1990 a Belarus declarou a sua soberania. Ao contrário do que ocorreu nos países Bálticos, o Partido Comunista, ou seja, a elite burocrática do país continuou comandando o processo político e dominando a economia.

    Com a Rússia e a Ucrânia, a Belarus participou do evento 8 de dezembro de 1991 que colocou fim a União Soviética e formou a Comunidade dos Estados Independentes. Assim, ao contrário dos países Bálticos que saíram da esfera de influência da Rússia, em direção ao ocidente, a Belarus e a Ucrânia permanecem unidas a Moscou.

    Portanto, observe uma questão importante: somente com o fim da União Soviética é que a Belarus teve a experiência de um Estado moderno soberano. Assim, a construção de um Estado nação se deu baixo a ditadura de Lukashenko. Esse fato levou-se até o questionamento se haveria uma identidade nacional Belarus e uma sociedade civil que poderia atuar.

    O governo de Alexandre Lukashenko

    Alexandre Lukashenko chegou o poder em 1994 e foi reeleito, 2001, 2006, 2010, 2015, formando um governo autoritário. Não faltam denúncias de violação aos Direitos Humanos no país. Através da violência, censura e mão de ferro, ele estabilizou o país formando uma classe de privilegiados, uma verdadeira oligarquia, sustentada pelas riquezas do país e em uma relação privilegiada com a Rússia.

    Apesar da aparente estabilidade, o regime começou a dar sinais de fragilidade. Um desses sinais, o mais evidente, se deu quando a Rússia ocupou parte da Ucrânia e tomou toda a Crimeia. A ideia de uma expansão russa continuada se tornou um pesadelo para a Belarus, como para todos os demais países que fazem fronteira com a Rússia.

    A invasão da Crimeia e a Reação da Belarus

    Após a anexação da Crimeia, Lukashenko pela primeira vez começou a discursar no idioma local. Seus discursos eram somente em russo, até então. O regime começou a apelar aos belarussos como uma nação e defender a sua soberania.

    Esse movimento fez com que o país se aproximasse dos países ocidentais, em particular dos países Bálticos e da Polônia. Acordos comerciais, educacionais e culturais foram estabelecidos no que parecia uma virada para o Ocidente.

    A virada para o Ocidente foi interrompida. Por um lado, a Rússia ofereceu certas vantagens comerciais. Além disso, diversos acordos militares com a Rússia, mas ainda com uma certa tensão, pois a ideia de instalar uma base aérea russa sofreu resistência. Em 2019, em um encontro com Putin, Lukashenko, em discurso coloca a ideia de união entre os dois países, ou seja, parecendo uma volta ao lado russo. Por outro lado, a União Europeia manteve restrições ao comércio com o país e criticas ao regime autoritário e as sistemáticas violações dos Direitos Humanos. Assim, o regime pareceu novamente pender para a Rússia.

    Resumindo, nos últimos anos Lukashenko tentou jogar dos dois lados observando de qual deles poderia conseguir maiores vantagens. Um jogo perigoso, pois seu autoritarismo nunca foi aceito pelos europeus e a sua relação com Putin não era das melhores, pessoalmente, ao que se sabe, Putin nunca teve apreço por Lukashenko.

    A Crise na eleição de 2020

    Essa situação piorou em 2020, com a pandemia, pois Lukashenko foi um dos líderes mundiais que entraram no negacionismo. Ele recomentou aos seus cidadãos: vodka, sauna e trator, como remédio para a Covid 19. O resultado, além de virar uma piada mundial, foi que sua credibilidade, já abalada, sofreu ainda mais ao se aproximar da eleição.

    O início do processo eleitoral se deu como sempre. Era para ser novamente uma eleição controlada. Em outras palavras, os candidatos seriam escolhidos a dedo, apenas com formalidade, e para dar ar de legitimidade. Os oposicionistas foram presos e exilados. Restou uma candidata que deveria ser a figurante nesse processo.

    A candidatura de Svetlana Tikhanovskaya era tida como um arranjo. Os demais líderes oposicionistas ou foram presos ou tiveram que escapar para outros países. .

    Assim, Svetlana Tikhanovskaya não faz parte de uma oposição histórica organizada contra o regime, pelo contrário. De toda forma, como ela era a única candidata houve uma união ao seu entorno já como uma forma de protesto contra ao regime. Na eleição, ela, que faz parte da elite educada, deveria apenas fazer a figuração para que se criasse a imagem de uma disputa legitima

    A propaganda eleitoral foi limitada, bem como as manifestações públicas. Cenas de manifestantes e de opositores ao regime sendo presos nas ruas vazaram para o ocidente e foram divulgados pelas mídias sociais.

    A Repressão e os Movimentos Grevistas

    Mesmo com a repressão e as limitações, a candidatura Tikhanovskaya encampou a contrariedade contra ao regime e houve uma união silenciosa para votar contra o regime. Esse movimento cresceu ao ponto de ser percebido pelo conjunto da população. Assim, no dia da eleição, ao fim da tarde, quando os primeiros dados eleitorais foram divulgados a desproporção dando a vitória ao ditador chamou a atenção. Era o indício da fraude que despertou os primeiros movimentos de protestos naquela mesma noite, sobretudo na capital Minsk.

    Nos dias que se seguiram, vimos emergir manifestações públicas cada vez maiores, reunindo milhares de pessoas em um fenômeno sem precedentes para o país. Essa movimentação foi seguida pela greve dos trabalhadores dos principais setores do país.

    As declarações públicas de Lukashenko geraram ainda mais protestos e sua aparição pública diante dos trabalhadores resultou em protestos e vaiais. Algo que ele não está acostumado a receber. A situação chegou ao patético do ditador apelar a Putin para uma eventual ajuda. Ou seja, a ameaça de intervenção russa voltou a circular.

    A Influência Russa na Belarus.

    A Belarus de Lukashenko sempre atuou na espera de influência da Rússia, sobretudo com Putin no poder. Por essa razão, vimos a cena patética de um presidente dizer que recorreria a outro para ajudar com o levante popular.

    No entanto, a Rússia tem os seus próprios problemas. Uma intervenção russa, como na Crimeia (ou mesmo na Síria), poderia resultar em reações tanto externa, como mais sanções econômicas. Lembrando que esse é um momento em que a economia russa passa por dificuldades, devido a queda no preço do petróleo e a pandemia. Além disso, a Rússia está lutando para uma presença de influência no cenário geopolítico, como pode ser observado com a questão da vacina, não por acaso denominada de Sputnik 5.

    Será que Putin estaria disposto a se colocar em risco para contribuir com Lukashenko? Ainda que Putin seja um estrategista repleto de surpresas e movimentos inesperados, uma ajuda a Belarus é um cálculo complicado não só pelas reações externas, mas principalmente pelas questões internas.

    O presidente Putin acabou de aprovar uma controversa reforma constitucional que o garante no poder perpetuamente. Esse referendo, suspeito, já provocou uma série de tensões no país. Recentemente protestos contra o seu poder foram registrados no extremo oriente da Rússia, na divisa com a China. Portanto, o cálculo envolve a seguinte questão: uma intervenção pode reforçar a imagem de autoritário e ditador, mas uma não intervenção pode significar que movimentos sociais como aqueles que agora parecem colocar fim ao regime de Lukashenko possa se espalhar pela Rússia.

    Nesse quadro, Putin terá que sentir a temperatura externa e interna para tomar a melhor decisão com relação ao regime. Não está descartado apenas trocar de figura no poder, mas que mantenha a política pró-Rússia que é, no fim das contas, o que realmente o interessa.

    Imprensa Russa

    Mesmo a imprensa russa, como a RT, já colocou a ditadura de Lukashenko como em um estágio final, ainda que observe que a sua última esperança esteja na proteção de Moscou e na vontade de Putin de que ele continue no poder.

    Putin, de acordo com a própria RT, ofereceu uma “vaga necessária assistência”. No discurso, a imprensa Russa coloca como ameaça a soberania da Belarus a influência de Varsóvia. Assim teríamos uma disputa entre Moscou e Varsóvia. Um discurso que tem por objetivo convencer o publico russo, pois o regime na Belarus parece estar chegando ao fim

    É o fim?

    Nesse momento, o ditador parece que conta apenas com as forças repressivas para conter a população. Será que isso será suficiente para manter a ditadura? As manifestações continuam crescendo a cada dia, bem como a violência. Nem mesmo a censura e os cortes na internet tem evitado a difusão de imagens da repressão para o mundo. A União Europeia, com protagonismo da Lituânia e da Polônia tem elevado o tom das críticas. Os próximos dias serão decisivos.

  • Pós-política: Direita e Esquerda

    Pós-política: Direita e Esquerda

    • Conceito de pós-política
    • impacto na política
    • pós-polítca e democracia

    Para compreendermos a nossa sociedade, os cientistas sociais formulam conceitos que possibilitam definir e entender características da nossa contemporaneidade. Atualmente, um conceito que começa a ser utilizado com mais frequência é o de pós-política. O que é pós-política? Como ela nos ajuda a entender o nosso momento político?

    Certamente, você já escutou pessoas afirmarem que não são: “nem de direita e nem de esquerda”. Que suas decisões e seus princípios são somente técnicos. Esse discurso, de valorização da técnica e de negação da política é o que podemos conceituar como pós-política.

    O que é a pós-política?

    A pós-política, ao valorizar a técnica, a boa gestão, a decisão administrativa, esconde no seu discurso a verdadeira opção política do indivíduo. Como se fosse possível para alguém se colocar acima das ideologias, ou acima da dela. Portanto, no discurso da pós-política, qualquer embate político e ideológico, é visto como negativo, como atraso ou desnecessário.  

    Por isso, políticos que se utilizam do discurso da pós-política tem por hábito acusar o outro de serem ideológicos. Assim, esses mesmo políticos estariam fora destes debates. Eles se consideram mais racionais e acima das disputas ideológicas.

    O problema da pós-política é que ela tem o papel de enganar aqueles que participam dela. Ela serve unicamente para mascarar um ponto de vista, uma ideologia. Assim, para esconder as verdadeiras posições diante das questões sociais. O pós-político se apresenta como técnico, quando, de fato, a sua verdadeira intenção estão dissimuladas, mascaradas, escondidas em planilhas, dados e distorções da realidade. Essa postura, tem por objetivo impedir o debate político. Sufocar as escolhas que a sociedade pode fazer.

    O debate e a Democracia

    Em uma democracia liberal, no Estado de Direito, a pós-política é perigosa, pois impede os debates de diferentes ideias, de diferentes opções que podem surgir em muito dos debates, sobre qualquer tema relacionado ao Estado ou a sociedade. A democracia, em uma perspectiva liberal, é justamente o debate, o conflito entre ideias e ideologias que se opõe e, dentro de um conjunto de regras consensualmente aceitos, disputam o seu espaço de poder sem eliminar a outra. Portanto, a anulação do debate por meio do tecnicismo, ou da negação da ideia do outro acaba por anular a própria política e por consequência a democracia.

    A consequência da pós-política é invariavelmente o autoritarismo, mesmo que disfarçado de uma democracia formal, pois a democracia precisa da política para ser efetiva. O autoritarismo, disfarçado de técnica e a negação da ideia do outro, nada mais é do que a imposição da vontade de um grupo sobre os outro. Resultando na negação, das vozes dissidentes, negando a oposição. Portanto, lembre-se, quando alguém se apresentar como neutro, como nem de direita ou de esquerda, quando alguém criticar a sua ideia como “ideológica”, está se usando a pós-política para impor a sua vontade e negar a sua voz e impor a sua vontade.

    Sugestões de vídeos e leituras.

    Vídeos:

    Artigos:

    Bucci, E. (2018). Pós-política e corrosão da verdade. Revista USP, (116), 19-30. https://doi.org/10.11606/issn.2316-9036.v0i116p19-30.

  • Brexit: considerações e palpites.

    Brexit: considerações e palpites.

    Por que o Brexit? 

    • Os motivos do Brexit
    • A União Europeia e o Brexit: história
    • Imigração e o Brexit

    Já que estão todos dando palpites e pitacos sobre o Brexit, aqui vão os meus.Toda a campanha Brexit foi conduzida pela direita xenófoba e com um discurso saudosista e nacionalista.

    No entanto, é importante lembrar que uma parte da esquerda sempre foi crítica à União Europeia e, mesmo o líder do Partido Trabalhista, não é lá um grande entusiasta (ou não foi durante muito tempo). Para além disso, a esquerda radical apoiou a saída e uma grande parte da classe trabalhadora também. Acrescentamos que uma grande parte da classe trabalhadora é contra as políticas migratórias.

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    Com o colapso da União Soviética em 1991, ao invés da União Europeia providenciar uma espécie de Plano Marshall que pudesse desenvolver, ou colocar a Europa Oriental nos trilhos, (como a Alemanha fez com a sua parte oriental), ela optou, baseada na teoria neoliberal, por abrir as portas do mercado para o Oriente, terminando de quebrar as empresas orientais recém ingressas no capitalismo, e permitir o fluxo da mão de obra (imigração).

    O ingresso da Polônia, principalmente, e dos países do Báltico (Lituânia, Letônia e Estônia), na União Europeia provocou uma onda interna de imigração na União Europeia. Esse fluxo se somou aos fluxos imigratórios das ex-colônias da Grã-Bretanha, já “tradicionais”, e aos refugiados dos conflitos no Oriente Médio.

    Essa imigração do leste europeu foi tão grande que na Lituânia é costume dizer que “os lituanos não estão emigrando, mas estão evacuando o país”. Assim como no caso polonês, um dos principais destinos é a Grã-Bretanha.  (sobre a Lituânia e a União Europeia ler AQUI)

    E qual é o problema do Brexit?

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    Bandeiras

    A imigração em massa foi uma estratégia do capital para depreciar o custo da mão de obra na Europa Ocidental. Na Inglaterra, a conservadora Margaret Thatcher (1925 – 2013), que governou entre 1975 e 1990, foi eliminando praticamente todos os direitos trabalhistas e os sindicatos. Seu conservadorismo social e seu neoliberalismo na condução econômica eliminaram o estado de bem estar social e privatizando todos os serviços públicos.

    A partir da década de 1990, com a imigração em massa do Leste Europeu, a mais uma abundante mão de obra, disposta a trabalhar por qualquer coisa, se acomodou a ausência de direitos trabalhistas. O resultado foi o empobrecimento da classe trabalhadora e a ampliação da desigualdade em níveis que só têm paralelos na Revolução Industrial do século XIX. Com a crise de 2008, a situação se agravou ainda mais. Vale lembrar, que a Grã-Bretanha que ainda segue a cartilha neoliberal como dogma é o único país desenvolvido que ainda não superou a crise de 2008, ao contrário da Alemanha, da França e dos Estados Unidos, por exemplo.

    As possibilidades do Brexit

    Diante desse quadro temos duas saídas possíveis:

    À direita: nacionalismo, saudosismo e xenofobia. Esses sentimentos dão a ilusão de que a mera remoção dos imigrantes resolverá o problema social, com a retomada do emprego. É uma ideia falsa! Pois removidos os direitos trabalhistas a desigualdade permanece! Ou seja, enquanto as práticas neoliberais persistirem persiste a desigualdade.

    À Esquerda: a do papel do Estado na promoção da equidade social. Aí temos um problema, pois a esquerda não sabe o que fazer com os imigrantes. De um lado, ela defende os direitos individuais e o de imigrar e o multiculturalismo (no que está certa!), mas o que fazer com essa mão de obra (imigrantes) trazida estrategicamente?

    Um problema sensível da esquerda é que ela, de uma forma ou de outra, sempre conseguiu atuar no âmbito nacional, mas não conseguiu efetivamente se organizar no âmbito internacional e menos ainda dentro da União Europeia. Jamais foi capaz de propor uma reforma igualando os direitos dos trabalhadores e a legislação trabalhista, por exemplo. Pelo contrário, como no vergonhoso caso francês é a tradicional esquerda que propôs a reforma trabalhista. O resultado final, salvo o cosmopolitismo londrino e de jovens que já nem mais conseguem se ver como parte dos “trabalhadores”: a saída foi vitoriosa.

    Depois da Euforia

    Apesar da euforia da extrema direita francesa, alemã e holandesa, o brexit não é necessariamente um indicativo da vitória da direita, ao menos na Inglaterra. A situação ali parece ser bem mais complexa. Por um lado, temos a popularidade do líder trabalhista inglês, Jeremy Corbyn. Por outro, é necessário saber se os conservadores vão conseguir se manter no poder e por quanto tempo.

    Em outras palavras quem fará a transição? Em que termos ela será feita? Quais os efeitos para a economia nos próximos meses? Nesse momento, qualquer tentativa de resposta para essa questão é apenas um chute!

    Aquele que conseguir intermediar as insatisfações sairá na frente neste processo.

    Com relação ao futuro da União Europeia, ao menos nos parâmetros em que a União está dada, será difícil se manter. É de fundamental importância lembrarmos que a estrutura de poder da União Europeia foi desenvolvida a partir de múltiplos acordos. A União Europeia foi articulada através da construção de consensos e não para a solução de crises. Na verdade, a União Europeia não tem mecanismos de solução de crises! Por isso sua movimentação e as respostas às crises são muito lentas…

    Por fim, será necessário acompanhar com muita atenção como a Grã-Bretanha vai lidar com a questão dos imigrantes. Uma política restritiva terá consequências desastrosas para outros países da União Europeia, notadamente, a Polônia e os países do Báltico.